*José Eustáquio Diniz Alves
“A floresta precede os povos. E o deserto os segue”
François-René Chateaubriand (1768-1848)
A preservação das florestas e o aumento da cobertura florestal passou a ser uma das maiores preocupações mundiais em função do agravamento do aquecimento global.
Diante do aumento dos incêndios e queimadas em vários países do mundo, mas especialmente no Brasil, o tema do desmatamento e da destruição florestal entrou na pauta do G7 (grupo dos 7 maiores países capitalistas) que aconteceu na cidade de Biarritz, na França, entre os dias 24 e 26 de agosto de 2019.
O presidente da França, Emmanuel Macron, mostrou preocupação com o desmatamento e as queimadas da Amazônia e levantou a possibilidade de definir um “status internacional” para a região, caso os países tomem decisões prejudiciais ao planeta.
Isto gerou uma montanha de reações e comentários no Brasil.
Mas o presidente Jair Bolsonaro defendeu a “Soberania nacional” e disse: “Somos o país que mais preserva o meio ambiente”.
Vejamos a realidade.
Quanto às florestas, o Governo Federal tem dito que o Brasil é o país com maior cobertura florestal do Planeta, o que não é verdade e tal afirmativa só contribui para alimentar as “fake News” e a pós-verdade.
Evidentemente, utilizando o indicador de área total, os países com maior área absoluta de floresta são aqueles com maior território.
A tabela abaixo mostra os 10 países com maior área florestal.
A Rússia, naturalmente, lidera a lista com uma área florestal quase do tamanho de todo o território brasileiro.
Em seguida vem o Canadá com quase 5 milhões de km2 de floresta.
O Brasil aparece em terceiro lugar à frente dos EUA e da China.
A índia aparece em 10º lugar.
Mas quando se considera a cobertura florestal relativa, isto é, a percentagem de florestas no território nacional, o Brasil aparece em 31º lugar.
A tabela abaixo mostra os 44 países que possuem cobertura florestal acima de 50%.
A lista é liderada por países pequenos e pouco povoados como Micronésia, Seychelles, Tuvalu, Palau e Gabão, todos com mais de 80% de florestas.
O interessante notar é que existem vários países ricos (com alto IDH) que possuem cobertura florestal bem superior a encontrada no Brasil.
Japão e Suécia são dois países que avançaram economicamente e socialmente sem destruir suas matas, já que possuem mais de dois terços de florestas.
A Coreia do Sul que teve uma grande devastação florestal durante a Segunda Guerra Mundial e durante a guerra entre as duas Coreias (1950-53) deu um exemplo que se pode avançar no desenvolvimento humano e na cobertura florestal ao mesmo tempo e hoje possui 63% do território verde.
Taiwan e Malásia que também possuem renda per capita acima da renda per capita brasileira conseguiram manter uma cobertura vegetal superior.
Portanto, o Brasil não possui nenhuma excepcionalidade nem na área e nem na percentagem de florestas.
Contudo, os setores nacionalistas (de direita e de esquerda) vivem afirmando que a “Amazônia é nossa” e criticam os governos e ambientalistas internacionais que reclamam da destruição da maior floresta tropical do mundo.
Ou seja, usando a desculpa nacionalista e o discurso da Grande Pátria e da Soberania Nacional, os setores nacionalistas desviam a atenção do crime de ecocídio que é a grande destruição da nossa maior floresta, difundindo o lema: “A Amazônia é nossa”.
Mas na verdade a Amazônia é dela mesma (Alves, 2012) e deve ser respeitada pelos seus direitos intrínsecos.
O nacionalismo tacanho só contribui para o desmatamento, a defaunação e o holocausto biológico, confirmando a frase de Samuel Johnson: “O patriotismo é o último refúgio dos canalhas”.
Olhando por um outro indicador, o Brasil possui a maior reserva ambiental absoluta do mundo, segundo a Global Footprint Network.
Contudo, o superávit ambiental era bem maior em 1961 (quando começaram os cálculos), cerca de 3 vezes o superávit atual.
Ou seja, o Brasil aumenta sua Pegada Ecológica e perde biodiversidade e vê seus ecossistemas serem degradados na medida em que avançam as atividades antrópicas e os índices de desenvolvimento humano.
Como mostraram Alves e Martine (2017), toda a riqueza natural deste imenso país está sendo ameaçada pelo descuido, degradação e exploração selvagem dos ecossistemas.
O aumento da poluição nas cidades, a destruição dos rios, o uso generalizado de fertilizantes e agrotóxicos, a construção de hidrelétricas, toda a cadeia produtiva industrial, a rede de comércio e serviços, a acidificação dos solos e das águas, a desertificação, a expansão da agricultura e da pecuária, o desmatamento, a malha de rodovias, os incêndios e queimadas, a exploração da biomassa, dentre outros tipos de degradação.
O desmatamento e a defaunação é uma realidade da história brasileira.
A Mata Atlântica ocupava uma área de aproximadamente 1.300.000 km2, estendendo-se por 17 estados do território brasileiro.
Hoje, os remanescentes de vegetação nativa estão reduzidos a cerca de 22% de sua cobertura original e encontram-se em diferentes estágios de regeneração.
Apenas cerca de 8% estão bem conservados em fragmentos acima de 100 hectares.
O Cerrado, o segundo maior bioma da América do Sul, ocupando uma área de 2.036.448 km2, cerca de 22% do território brasileiro, é o segundo bioma brasileiro que mais sofreu alterações com a ocupação humana, tendo perdido 70% da sua cobertura original.
Além disto, o Brasil desmatou 13% do Pantanal, cerca de 50% da Caatinga, 54% do Pampa, 99% da Mata de Araucária, cerca de 25% dos manguezais somente nos anos 2000 e cerca de 35% da Mata de Cocais.
A Floresta Amazônica é o maior bioma do Brasil: num território de 4,196.943 milhões de km2 crescem 2.500 espécies de árvores (ou um terço de toda a madeira tropical do mundo) e 30 mil espécies de plantas (das 100 mil da América do Sul).
Dados do Prodes do INPE, mostram que o desmatamento, de 1988 a 2014, atingiu o montante de 408 mil km².
Essa área desflorestada é maior do que a soma dos territórios dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Alagoas, Sergipe e Distrito Federal.
No total, as seis Unidades da Federação possuem uma área de 393.462 km².
Outros 400 mil km² foram destruídos entre 1965 e 1988.
Assim, o Brasil já desmatou mais de 20% da Floresta Amazônica.
E os nacionalistas dizem que a “Amazônia é nossa” – isto é, para o bel prazer da destruição “tupiniquim”.
Ou seja, o maior país da América do Sul já destruiu cerca de 90% da Mata Atlântica e grande parte dos outros biomas.
Agora caminha para destruir a Amazônia, enfraquecer as instituições que fornecem dados sobre o desmatamento e eliminar as pessoas que lutam para manter a floresta de pé e garantir a sobrevivência dos povos da região.
O Brasil é o país que mais mata e desmata.
E o governo brasileiro em vez de evitar o desastre ambiental tem atuado no sentido de acelerar a destruição ecossocial e as bases da biodiversidade.
Na semana de 20 a 27 de setembro de 2019 haverá a greve global contra a destruição da natureza e em defesa do futuro.
Será a Greve Global pelo Clima.
O povo brasileiro precisa se inspirar na greve dos adolescentes contra as mudanças climáticas e iniciar um grande movimento de massas para defender o meio ambiente e não derrubar árvores, mas sim governos incompetentes e que contribuem para a destruição da base ecológica da vida na Terra.
*José Eustáquio Diniz Alves : Colunista do EcoDebate/Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Fonte: EcoDebate